Rev Andal Med Deporte. 2021; 14(2): 70-76


Revista Andaluza de

Medicina del Deporte

 

https://ws208.juntadeandalucia.es/ojs

 

Original

Reprodutibilidade teste-reteste de uma bateria de avaliação motora para jogadores de bocha paralímpica

J. I. Oliveiraa, L. I. Oliveirab, S. Arrudaa, S. Oliveirac*

a Graduação em Educação Física. Discente do Programa de Pós-Graduação em Educação Física. Universidade Federal de Pernambuco. Brasil.
b Mestrado em Educação Física. Discente do Programa Associado de Pós-Graduação em Educação Física. Universidade Federal de Pernambuco. Membro da Academia Paralímpica Brasileira. Brasil.
c Doutorado em Educação Física. Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação Física. Centro Acadêmico de Vitória. Núcleo de Educação Física e Ciências do Esporte. Universidade Federal de Pernambuco. Membro da Academia Paralímpica Brasileira. Brasil.



INFORMAÇãO sobre o artigo: Recebido a 23 de abril de 2020, aceite a 3 de junho de 2020, online a 6 de julho de 2020

 

 

RESUMO

Objetivo: a bocha paralímpica é uma modalidade baseada em controle motor, tomada de decisão e precisão. Muito embora haja aumento no número de participantes e no desempenho apresentado pelos atletas nos eventos mundiais, diferente de outros esportes paralímpicos, a modalidade ainda não dispõe de protocolos para avaliação motora específicos destinados aos praticantes. Nosso objetivo foi montar e avaliar a reprodutibilidade de uma bateria de testes para avaliação das capacidades motoras na bocha paralímpica.

Método: Os testes selecionados consideraram características pertinentes a prática da modalidade: a) teste de coordenação de mãos; b) teste de tempo de reação de mãos; c) teste de capacidade aeróbia; e d) teste de agilidade em formato “oito”, escolhidos pela praticidade. Dez jogadores participaram da aplicação da bateria, sendo avaliados com 7 dias de diferença. Foram determinados o viés (método de Bland-Altman), o coeficiente de correlação intraclasse (CCI) e o erro padrão de medida (EPM).

Resultados: A análise dos dados revelou excelentes características de estabilidade das medidas ([coordenação de mãos: viés = -3.700; CCI = 0.87; EPM = 5.53]; [tempo de reação de mãos: viés = -0.500; CCI = 0.99; EPM = 1.53]; [capacidade aeróbia: viés = 8.333; CCI = 0.98; EPM = 16.44]; [agilidade no formato “oito”: viés = 2.980; CCI = 0.93; EPM = 5.28]).

Conclusão: Recomendamos avaliações em outros atletas no sentido de criar padrões normativos baseados nas classes funcionais e no nível de desempenho dos praticantes.

Palavras-chaves: Desempenho atlético; Pessoas com deficiência; Paralisia Cerebral; Para-Atletas.

 

Reproducibilidad test-retest de una batería de pruebas motoras para jugadores de bocha paraolímpica

RESUMEN

Objetivo: la bocha paralímpica es una modalidad basada en el control motor, la toma de decisiones y la precisión. Aunque hay un aumento en el número de participantes y en el rendimiento presentado por los atletas en eventos mundiales, a diferencia de otros deportes paralímpicos, la modalidad aún no tiene protocolos específicos de evaluación motora para los profesionales. Nuestro objetivo fue reunir y valorar la reproducibilidad de una batería de pruebas para evaluar las habilidades motoras en la pelota de bocha paralímpicas.

Método: Las pruebas seleccionadas consideraron características relevantes para la práctica de la modalidad: a) prueba de coordinación manual; b) prueba de tiempo de reacción manual; c) prueba de capacidad aeróbica; y d) prueba de agilidad en formato "ocho", elegida por su practicidad. Diez jugadores participaron en la aplicación de la batería, siendo evaluados con siete días de diferencia. Se determinó el sesgo (método de Bland-Altman), el coeficiente de correlación intraclase (ICC) y el error estándar de medición (EPM).

Resultados: el análisis de datos reveló excelentes características de estabilidad de las medidas ([coordinación manual: sesgo = -3.700; CCI = 0.87; EPM = 5.53]; [tiempo de reacción de la mano: sesgo = -0.500; CCI = 0.99; EPM = 1.53]; [capacidad aeróbica: sesgo = 8.333; CCI = 0.98; EPM = 16.44]; [agilidad en el formato "ocho": sesgo = 2.980; CCI = 0.93; EPM = 5.28]).

Conclusión: Recomendamos evaluaciones en otros atletas para crear estándares normativos basados en las clases funcionales y el nivel de desempeño de los practicantes.

Palabras clave: Rendimiento atlético; Personas con deficiencia; Parálisis Cerebral; Para-Atletas.


 

Test-retest reproducibility of a motor tests for paralympic boccia players

ABSTRACT

Objective: the paralympic boccia is a modality based on motor control, decision making and precision. Although there is an increase in the number of participants and in the performance presented by athletes in world events, unlike other paralympic sports, the modality does not yet have specific motor assessment protocols for practitioners. Our objective was to assemble and evaluate the reproducibility of a battery of tests to assess motor skills in the paralympic bocce ball.

Method: The selected tests considered characteristics relevant to the practice of the modality: a) hand coordination test; b) hand reaction time test; c) aerobic capacity test; and d) “eight” format agility test, chosen for practicality. Ten players participated in the battery application, being evaluated 7 days apart. The bias (Bland-Altman method), the intraclass correlation coefficient (ICC) and the standard error of measurement (EPM) were determined.

Results: Data analysis revealed excellent stability characteristics of the measures ([hand coordination: bias = -3.700; ICC = 0.87; EPM = 5.53]; [hand reaction time: bias = -0.500; ICC = 0.99; EPM = 1.53]; [aerobic capacity: bias = 8.333; CCI = 0.98; EPM = 16.44]; [agility in the "eight" format: bias = 2.980; CCI = 0.93; EPM = 5.28]).

Conclusion: We recommend evaluations on other athletes in order to create normative standards based on the functional classes and the level of performance of the practitioners.

Keywords: Athletic performance; Disabled persons; Cerebral Palsy; Para-Athletes.

 

 

Introdução

A bocha paralímpica é uma modalidade esportiva presente nos jogos paralímpicos desde a edição de 1984, em Nova Iorque1. Constitui-se em uma adaptação do esporte original, comum em regiões da Europa e América do Sul. Sua versão adaptada apresenta grande potencial inclusivo, especialmente por tornar elegíveis para sua prática pessoas com deficiência motora severa, tais quais paralisia cerebral, tetraplegia e má formações congênitas e doenças degenerativas. É subdividida em quatro categorias, que variam conforme a capacidade funcional dos praticantes em termos de autonomia para lançar suas bolas além do controle da cadeira de rodas durante o jogo2.

Um ponto importante deste esporte é a precisão do gesto técnico dos atletas, pois é uma habilidade motora fundamental para que o arremesso seja bem-sucedido3. Outros fatores determinantes para um bom arremesso: coordenação, foco, ajuste e controle do movimento, amplitude e mobilidade articular e força. Além de todos esses fatores, capacidades de explosão e recuperação entre os diversos momentos de lançar influenciam na qualidade do arremesso. As investigações realizadas até o momento têm demonstrado que a demanda fisiológica e neuro-motora aumenta de acordo com a distância com que o alvo (bola alvo ou bola do adversário) está posicionada mais distante3,4, e que técnicas sistematizadas5 e digitais6 parecem ser viáveis para o treinamento dos atletas.

As bases para o treinamento e acompanhamento da evolução dos atletas paralímpicos estão relacionadas aos processos de avaliação. Considerando as especificidades de cada modalidade esportiva, se faz necessário obtermos indicadores mais próximos as reais demandas impostas aos atletas7,8. No âmbito Paralimpico, algumas modalidades tem produzido rotinas de avaliação específicas, tais quais o basquetebol em cadeiras de rodas9,10, o rúgbi em cadeiras de rodas11,12, o tênis em cadeiras de rodas13 e o voleibol sentado14,15, todas unindo capacidades físicas e técnicas em seus protocolos. Para os esportes individuais normalmente são considerados protocolos que levem em consideração as capacidades condicionais e coordenativas, como sendo indicadores que possam guardar relação com o desempenho final da prova, a exemplo do que se observa no atletismo e da natação paralímpica7,16,17. Já nos esportes coletivos, em especial aqueles realizados com locomoção em cadeiras de rodas, normalmente se recorrem a testes que levem em consideração o binômio “sujeito+cadeira de rodas”, em virtude das características ergonômicas envolvidas18,19, além de outras habilidades técnicas que caracterizam o desempenho em quadra9,20.

A despeito da sua evolução em termos de número de atletas e resultados expressivos, a bocha paralimpica não possui suas rotinas de avaliação específicas, devidamente testadas em termos de critérios de autenticidade científica. Sabidos disto, até o presente momento, inexistem testes motores que possam avaliar e monitorar capacidades condicionantes, coordenativas e técnicas no dia-a-dia dos praticantes, seja para o controle dos treinos e dos indicadores de desempenho esportivo na modalidade. Assim, nosso objetivo foi apresentar e demonstrar a reprodutibilidade de uma bateria de testes para avaliação de capacidades motoras de jogadores de bocha paralimpica.

 

Método

Sujeitos

Todos procedimentos deste estudo foram conduzidos eticamente de acordo com a Declaração de Helsinki de 1995 e padrões éticos na pesquisa em ciências do esporte e do exercício. O Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Pernambuco aprovou o estudo sob o número CAAE: 22542619.0.0000.9430 e o Termo de Consentimento Livre Esclarecido obtido de cada participante. Todos os participantes possuem experiência com a prática da bocha paralímpica, com participação em eventos regionais, nacionais e internacionais. A amostra se configurou em 10 indivíduos (6 do sexo masculino; 4 do sexo feminino).

Delineamento experimental

A referida bateria de testes foi desenvolvida pelos próprios autores (sob coordenação dos pesquisadores SO e LIG), todos com formação profissional em educação física e esportes, com se baseando em suas experiências com o treinamento na bocha paralímpica (mais de cinco anos), com participação em evento regionais, nacionais e internacionais. Após a bateria ter sido escolhida todos os testes foram apresentados aos treinadores da equipe que participou das coletas de dados, para que fossem retiradas dúvidas quanto a sua aplicação e o significado de cada variável selecionada. Os testes foram escolhidos no sentido de representar algumas das principais dimensões motoras que possam, direta ou indiretamente, influenciar o desempenho de jogadores de bocha em quadra, tornando-se indicadores importantes para o controle da efetividade durante as rotinas de treinamento. Para entender as referidas dimensões, observaram-se as características do jogo e especialmente dos jogadores, de acordo com a interação existente entre a deficiência dos atletas, a sua funcionalidade de movimento e as regras da modalidade. Assim, foram definidas as dimensões de capacidades condicionantes/coordenativas relacionadas a: a) coordenação de membros superiores; b) tempo de reação de membros superiores; c) agilidade; e d) capacidade aeróbia. Na Figura 1, segue um esquema que delimita cada dimensão, justificando as características do jogo contempladas.

Figura 1. Delimitação das capacidades motoras requeridas ao jogador de bocha adaptada.

 

Em seguida, os critérios escolhidos para desenvolvimento da bateria de testes disseram respeito a facilidade no entendimento pelos avaliadores/treinadores e jogadores (linguagem simples e direta), da facilidade na aplicação dos protocolos (materiais e equipamentos acessíveis), além de terem relação direta com as capacidades coordenativas/condicionantes observadas e as necessidades motoras dos atletas. Os testes foram realizados nos próprios locais de treinamento dos jogadores. Os mesmos procedimentos, para toda a bateria de testes, foram realizados em duas ocasiões, com intervalo de sete dias entre elas, sendo realizado no mesmo horário do dia. Os jogadores foram orientados a seguirem suas rotinas, a se alimentarem como de costume e a não realizarem atividades físicas vigorosas 24 horas antes das avaliações.

Teste de coordenação de mãos (adaptado de Guedes21): o teste faz parte da bateria de avaliação EUROFIT22, já utilizado e validade em amostras de pessoas com deficiência23,24. o instrutor usará uma mesa como material de ficção de uma fita crepe. Irá demarcar um espaço de 60 centímetros entre duas marcações (adaptável, dependendo do grau de deficiência, para 30 cm). A atividade durará 30 segundos cronometrados. Para aplicação do teste, pedirá ao para-atleta aproximar e encaixar sua cadeira em um local confortável. Sua mão não-dominante ficará no centro entre as duas marcações, em contraponto, a mão dominante repousará sobre a outra à espera do comando do instrutor. No comando do instrutor, o para-atleta executará, mais rapidamente possível a sequência de batidas nas marcações definidas. O número de batidas em sequência será contado pelo instrutor e contabilizada na ficha de controle. O teste será repetido em dois dias distintos, com uma sequência de duas seções com um intervalo de tempo de um minuto. Adaptações possíveis: a distância entre os pontos de alcance pode ser reduzida até a metade do tamanho original, além da altura e da posição da mesa para alcance por parte do jogador. Aqueles jogadores com adaptações para o jogo (classe BC3), podem realizar o movimento com a melhor adaptação possível (capacetes, ponteiras, bastões e similares).

Teste de tempo de reação de mãos (adaptado de Guedes21): trata-se de um protocolo baseado no teste de tempo de reação de mãos de Nelson25, normalmente utilizado para avaliação de pessoas idosas, e já utilizado em outras modalidades esportivas praticadas com os membros superiores26,27. O teste terá como material de apoio uma régua de 30 centímetros (adaptável, dependendo do grau da deficiência, um bastão de 70 centímetros) e uma fita métrica para medição. O para-atleta estenderá seu braço e abrirá a palma de sua mão. O instrutor fixará a base da régua (bastão) em contato com a base do dedo indicador, e como comando: “prepara”, deixará em alerta o para-atleta para a soltura do objeto. Com a reação do para-atleta segurando o objeto, o instrutor marcará a base da palma da mão como indicação para a medida da fita métrica. A medida será contabilizada pelo instrutor na ficha de controle. O teste será repetido em dois dias distintos, com uma sequência de duas seções com um intervalo de tempo de um minuto. Adaptações possíveis: aos jogadores com dificuldades de executar o movimento de “pegada”, há possibilidade de ser realizada a sustentação da régua com ambas as mãos, em um movimento similar ao de “bater palmas”, ou mesmo utilizando as ponteiras, capacetes, bastões ou a respectiva adaptação de cada jogador.

Teste de agilidade formato “8” (adaptado de Kilkens28,29): este protocolo é utilizado em diversas baterias de avaliação da mobilidade de usuários de cadeiras de rodas30,31 compondo um aspecto funcional dos atletas de bocha paralímpica pelos pequenos deslocamentos realizados na quadra de jogo. Como padrão, são usados cones do mesmo formato e cor, distanciados em 2 metros e 40 centímetros. O instrutor cronometra o tempo em um aparelho celular. Após o comando do instrutor, o para-atleta percorrerá a distância entre os cones no formato de um “8”. Alguns para-atletas usarão cadeiras motorizadas, outros usarão cadeiras manuais. Será indicado o para-atleta a percorrer todo o percurso sem pausas. O tempo alcançado pelo para-atleta será contado pelo instrutor e contabilizada na ficha de controle. O teste será repetido em dois dias distintos, com uma sequência de duas seções com um intervalo de tempo de um minuto. Adaptações possíveis: nenhuma adaptação excessiva é necessária para este protocolo, tendo em vista que pode ser administrado em jogadores com cadeiras de rodas manuais ou mesmo automáticas.

Teste aeróbio de 6 minutos (adaptado de Cowan32): este protocolo foi originalmente desenvolvido por Cowan et al32, e já demonstrou boa aplicabilidade em pessoas com paralisia cerebral33. o teste terá como material de apoio uma fita métrica de 10 metros, 10 cones (marcação a cada metro) e fita crepe para fixação da fita métrica no chão. O para-atleta, ao comando do instrutor, percorrerá os 10 metros indicados em linha reta. O percurso será constante (ida e vinda) com a duração de 6 minutos cronometrados em um telefone celular. Na planilha, será anotada, a cada minuto, a quantidade de voltas completadas durante os 6 minutos do teste aeróbio. O teste será repetido em dois dias distintos, com uma sequência de duas seções com um intervalo de tempo de três minutos. Adaptações possíveis: este protocolo é destinado apenas aos jogadores que conseguem mover a cadeira de rodas manualmente.

Análise estatística

Os dados descritivos dos jogadores foram organizados individualmente e por meio dos valores médios e do desvio-padrão. No sentido de comparar os valores médios obtidos entre os dias 1 e 2 de avaliação recorreu-se a um teste t para amostras pareadas. Para verificar a estabilidade das medidas, optou-se por utilizar o método de análise gráfica de Bland-Altman34, com verificação dos respectivos vieses e limites de concordância estabelecidos (inferior e superior). Adicionalmente, recorreu-se aos cálculos do coeficiente de correlação intraclasse (CCI), do erro-padrão de medida (EPM) pela equação   onde DP é o maior desvio-padrão verificado entre os momentos de coleta (1 e 2). Em posse desses indicadores, calculou-se a mínima diferença detectável (MDD) por meio da fórmula  . Tais estratégias já foram utilizadas em estudos anteriores35. Os dados foram analisados no software Prism, versão 6.0 (Graphpad, EUA), e o nível de significância adotado foi de 5% (p<0.05).

 

Resultados

 

Na Tabela 1 são apresentadas as características gerais dos jogadores avaliados na pesquisa. Observa-se que os atletas possuem média de experiência de 49.50±28.54 meses (aproximadamente 4 anos), com 13.40 horas de treinamento por semana, em média.

 

 Tabela 1. Dados descritivos dos jogadores participantes da pesquisa.

ID

Idade

(anos)

CF

(pontos)

Deficiência

(tipo)

Tempo de experiência (meses)

Volume de treino semanal (horas)

01

29

BC2

PC

48

24

02

36

BC2

PC

48

18

03

24

BC4

Má formação

24

12

04

22

BC4/BC5*

Paraplegia alta

24

8

05

24

BC3

DM

3

12

06

18

BC1

PC

48

12

07

23

BC2

PC

96

12

08

31

BC4

DM

48

12

09

36

BC2

PC

84

12

10

24

BC1

PC

72

12

M

26.70

--

--

49.50

13.40

DP

6.06

--

--

28.54

4.43

ID: nº de identificação do jogador; CF: classe funcional; PC: paralisia cerebral; DM: distrofia muscular; M: média; DP: desvio-padrão; * BC5 é uma classe funcional já é reconhecida pelas entidades de controle internacionais, ainda que não esteja presente em competições oficiais da modalidade.

 

Ao compararmos os dias 1 e 2 de avaliação, verifica-se que não há diferenças estatisticamente significativas entre os momentos, com diferença de 7 dias entre as avaliações (Figura 2). Os valores médios de cada teste selecionado encontram-se apresentados na Figura 2 (painéis A-D).

Figura 2. Comparação das médias entre os dias de avaliação (1 e 2), para cada teste selecionado. P: significância estatística verificada por meio do teste t pareado; barras vermelhas (momento 1 de coletas); barra azuis (momento 2 de coletas).

Em relação a análise de confiabilidade teste-reteste por meio do método de Bland-Altman, os resultados de comparação entre os resultados dos dois dias de avaliação encontram-se apresentados na Figura 3.

Figura 3. Análise gráfica de Bland-Altman entre os dias 1 e 2 para cada teste aplicado. LS: limite superior de concordância; LI: limite inferior de concordância.

 

Observam-se vieses baixos para cada um dos testes aplicados, sendo consideráveis aceitáveis em termos de critérios de autenticidade científica no contexto da avaliação do desempenho (teste de coordenação de mãos: viés: -3.700 e p=0.015; teste de tempo de reação: viés -0.500 e p=0.820; teste aeróbio de 6 minutos: viés: 8.333 e p=0.131; teste de agilidade formato “8”: viés: 2.980 e p=0.228). Os resultados apresentados confirmam a excelente aplicabilidade no contexto do treinamento, reabilitação ou mesmo iniciação de jovens jogadores de bocha adaptada. Finalmente, na Tabela 2 são apresentados os coeficientes de correlação intraclasse (CCI), o erro padrão de estimativa (EPE) e a mínima diferença detectável (MDD) para cada teste avaliado.

 

 Tabela 2. Valores dos coeficientes de reprodutibilidade selecionados para cada teste avaliado

Teste avaliado

CCI

EPE

MDD

Coordenação mãos

0.87

5.53

5.45

Tempo de reação mãos

0.99

1.53

2.87

Capacidade aeróbia

0.98

16.44

9.40

Agilidade “8”

0.93

5.28

5.33

CCI: Coeficiente de Correlação Intraclasse; EPE: Eerro-Padrão de Estimativa; MDD: Mínima Diferença Detectável.

 

Discussão

 

Nosso objetivo foi apresentar uma bateria de testes para avaliação motora de jogadores de bocha paralímpica. Os testes selecionados seguiram os pressupostos de adaptabilidade, e acessibilidade para sua seleção, no sentido de tornarem-se fáceis de aplicar e demandando pouco material para sua utilização. Ao aplicarmos aos mesmos atletas a bateria proposta, observou-se ótimos resultados de reprodutibilidade, representados pelo CCI, pelo EPM e também pela análise gráfica de Bland-Altman. Adicionalmente, propomos valores mínimos para que os treinadores ou terapeutas possam avaliar seus atletas e acompanhar a evolução das intervenções realizadas.

Estes resultados estão de acordo com investigações anteriores que propuseram baterias de testes para outras modalidades paralímpicas. Vanlandevijck, Daly e Theisen10, adaptaram uma bateria de testes para o basquetebol em cadeiras de rodas, encontrando valores de coeficiente de correlação (“r”) acima de 0.65, para os testes de campo com bola. De forma similar Gorla et al12, encontraram valores superiores de “r” 0.84, ao validar a bateria Beck em jogadores brasileiros de rúgbi em cadeiras de rodas. Este mesmo comportamento de estabilidade das medidas também foi observado para amostras de jogadores de tênis em cadeiras de rodas13 e voleibol sentado14,15.

Determinadas razões podem ter colaborado para a elevada confiabilidade e veracidade dos testes que foram achados nesta pesquisa. A princípio, destaca-se que as sessões de teste e reteste para todas a medições foram separadas por sete dias. Este distanciamento pode impedir as decorrências do aprendizado dos indivíduos sobre a reprodutibilidade destas medidas. Portanto, a utilização do objetivo do protocolo, explicações, a posição e a atmosfera no decorrer das duas sessões de testagem podem ter contribuído com a solidez dos resultados. Tais resultados são reforçados pela comparação entre a médias dos resultados, que não apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre os dias 1 e 2 (figura 2, painéis A, B, C e D).

A concepção de testes, voltados para a avaliação dos elementos da aptidão física, tem aparecido como um instrumento prático para a avaliação e domínio do treinamento em distintas populações. Contudo, parece existir uma carência de pesquisas que empregam estes resultados para as modalidades paraolímpicas. Neste sentido, nossos resultados confirmam elevados valores de confiabilidade, com baixo erro, sugerindo que os testes podem ser utilizados como uma alternativa viável para a periodização de treinamentos.

Os resultados aqui levantados oferecem informações pertinentes e que podem servir de contribuição para treinadores e comissão técnica na produção de suas atividades, de modo a observar mais variáveis do treinamento e propondo ações competitivas mais elevadas. Destaca-se que os testes são de baixa despesa e de compreensível aplicabilidade nas circunstâncias sociais, uma vez que proporciona ao técnico, sem o uso de alta tecnologia, a sua execução. Ao analisarmos os valores de MDD (tabela 2) dos quatro testes avaliados, valores de 5.45 toques, para o teste de coordenação de mãos, 2.87 centímetros, para o teste de tempo de reação de mãos, 9.40 metros, para o teste aeróbio, e 5.33 segundos, para o teste de agilidade. Esses achados sugerem que treinadores deveriam considerar resultados superiores aos destacados, a fim de obter estratégias de verificação dos efeitos relacionados as intervenções realizadas.

A princípio, esses são critérios mínimos para detecção de melhorias nesses indicadores de capacidade, tornando-se uma ferramenta inovadora para a modalidade. Sugere-se para futuras pesquisas, avaliar amostras mais numerosas a fim investigar e padronizar os valores dessas e outras variáveis motoras ao longo das classes funcionais da bocha paralímpica. Também pode-se acrescentar as avaliações dos atos técnicas e táticas em quadra, e padronização do gesto de precisão, correlacionando essas ações com a classificação funcional dos atletas e os achados nos testes físicos e motores.

Esta investigação possui algumas limitações. Inicialmente o tamanho reduzido de sujeitos evidencia a necessidade de mais pesquisas nessa área e dificulta a generalização dos resultados no contexto da bocha paralímpica. Contudo, há que se reforçar a similaridade dos tamanhos amostrais encontrados em estudos com a modalidade5,36, fato que é explicado, ao menos em parte, pela ausência de homogeneidade dos grupos de pessoas com deficiência, em especial nos quadros mais severos, além a frequência baixa de treinamento de alguns clubes e atletas. Neste sentido, outra limitação importante é a ausência de jogadores da classe BC3. O motivo da não análise de atletas com essas características diz respeito as limitações naturais oriundas da própria condição motora dos sujeitos. Ainda assim, há possibilidade de adaptação dos testes de acordo com a necessidade particular de cada atleta. Porém essas adaptações precisam ser testadas e avaliadas.

Os testes escolhidos para comporem a bateria de protocolo possuem muitas em relação a outras medidas mais sofisticadas utilizadas para avaliar atletas de bocha37,38, especialmente no âmbito da classificação funcional baseada em evidência39. A principal vantagem diz respeito a necessidade de poucos materiais para sua montagem e execução, além da baixa complexidade de entendimento em sua realização. Este caráter acessível e de baixa complexidade são essenciais para aplicação da bateria no contexto dos clubes que fomentam a bocha paralímpica, especialmente em condições de escassez de recursos materiais e também em nível de entendimento dos próprios atletas, pela condição de déficit cognitivo acompanhado por alguns tipos de deficiência motora. Por outro lado, a bateria de testes resulta de habilidade e treinamento para aplicação por parte dos avaliadores, o que pode diminuir sua acurácia e reprodutibilidade em alguns contextos ambientais de treinamento, periodização ou mesmo de competição. Recomenda-se que delineamentos baseados em teste-reteste possam ser realizados para adequar o protocolo a cada realidade.

Como conclusão, observou-se excelentes resultados de reprodutibilidade da bateria proposta, demonstrando a possibilidade de ser utilizada no contexto do treinamento ou mesmo iniciação de jovens jogadores da modalidade. Por fim, recomendamos que possam ser avaliados outros jogadores, com níveis de treinamento e experiências distintos, no sentido de construir uma padronização normativa para categorizar os jogadores de diferentes capacidades motoras, níveis de desempenho e classificações funcionais.

 


Autoria. Todos os autores contribuíram intelectualmente no desenvolvimento do trabalho, assumiram a responsabilidade do conteúdo e, da mesma forma, concordam com a versão final do artigo. Financiamento. Os autores agradecem a ---- pelo apoio financeiro e pela bolsa outorgada. Agradecimentos. Os autores agradecem a ANDE (Associação Nacional de Desportos para Pessoas com Deficiência) ú pelo apoio nossa pesquisa, bem como aos atletas que se disponibilizaram a participar do studo, em especial os clubes ADVISA e UFPE. Agradecemos tambm ao Núcleo da Educação Física e ao Centro Acadêmico de Vitória, pelo aprovação do Projeto e pelo auxilio na coleta de dados. Conflito de interesses. Os autores declaram não haver conflito de interesses. Origem e revisão. Não foi encomendada, a revisão foi externa e por pares. Responsabilidades Éticas. Proteção de pessoas e animais: Os autores declaram que os procedimentos seguidos estão de acordo com os padrões éticos da Associação Médica Mundial e da Declaração de Helsinque. Confidencialidade: Os autores declaram que seguiram os protocolos estabelecidos por seus respectivos centros para acessar os dados das histórias clínicas, a fim de realizar este tipo de publicação e realizar uma investigação / divulgação para a comunidade. Privacidade: Os autores declaram que nenhum dado que identifique o paciente aparece neste artigo.


 

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Autor para correspondência.

Correios eletrónicos: saulofmoliveira@gmail.com (S. Oliveira).

 

https://doi.org/10.33155/j.ramd.2020.06.002

© 2021 Consejerı́a de Educación y Deporte de la Junta de Andalucı́a. Este é um artigo Open Access sob uma licença CC BY-NC-ND (http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/)